Há uns vintes anos eu era magrinha, “sunguela” – não sei o que significa ao pé da letra, mas é como chama o povo magricela pelas bandas daqui – só tinha um cabeção e muito peito. Todo mundo achava bem estranho eu ter muita mama, quando a genética das mulheres da família era o oposto. Mal sabiam eles que, lá pela faixa dos 7 ou 8 anos, eu e Carol, minha prima-irmã, passávamos cebola no peito pra ele crescer. A gente ouviu isso em algum lugar, Deus sabe onde. Esse mesmo Deus, também, deve saber porque os meus cresceram tanto. Os de Carol também.
Será que foram as cebolas?
Cheguei aos vinte anos e sabe
qual era meu maior desejo? Reduzir a mama. Isso piorou muito depois que fiz o
teste da caneta. A direita não segurava a caneta, já a esquerda era pêra: pera cintura.
Consegui a tão sonhada cirurgia,
fui pra faca e não queria pensar em pós-operatório, só queria ter os peitos no
lugar. Dr. Hildo fez um belíssimo trabalho. Nunca me arrependi. Das cebolas,
talvez.
Com o passar dos anos, vida
corrida e agitada, o mundo moderno me trouxe ansiedade, pânico, estresse,
jornadas longas e desgastantes de trabalho e, volta e meia, ainda tinha uma
fobia social, logo, eu me isolava e me encontrava na comida. Ainda me encontro.
Já não era/sou mais àquela “sunguela”.
E, chega um momento que o tempo
não é aliado, você ganha peso só em pensar naquele combo do KFC. Peso esse que
leva meses pra perder. Meu metabolismo não ajudava, minhas crises de ansiedade cada
vez mais recorrentes, muito menos. Eu usava toda e qualquer situação para
procrastinar. Aceito o apelido de gordinha, sofro bullyning dos meus amigos de
banda e, por incrível que pareça, nada disso me incomoda ou pelo menos parece que
não.
Até que, ano passado, eu cheguei
aos 3 dígitos e isso sim me doeu profundamente. Chorei um dia e uma noite. Tive
total convicção que não tinha mais jeito. “Era melhor morrer logo”; “Quem
danado vai se interessar por essa frots free”; “Nada serve, tudo fica feio”; “Não
quero mais sair, porque minhas amigas são bonitas e magras”...
Não sei se era pior eu me dizer
essas coisas ou ouvir: “Você é fofinha”, “É gordinha, mas tem tudo no lugar”; “Toda
gordinha é linda”... Posso ser uma fofura, ter tudo no lugar e uma lindeza, mas
continuo gorda.
Cheguei a cogitar uma cirurgia
bariátrica, algo que eu condenei a vida inteira – não por não acreditar –
apenas por entender que eu podia mudar essa realidade, fácil não seria, mas é
totalmente possível.
Então lembrei das cebolas que
passara nos peitos. Sou exatamente como elas, tenho várias camadas e ao longo
desses quase 38 anos eu fui tirando cada uma dessas peles, em algumas fazia
chorar tal qual o bulbo, contudo, todas elas foram essenciais para eu me tornar
a mulher que sou hoje: adulta, espiritualizada, buscando todos os dias ser
melhor do que fui ontem, independente, em paz com as minhas escolhas, grata,
madura, ansiosa e GORDA.
E eu morro de orgulho dessa mulher!
Gabi D.
Texto
produzido para o 4º desafio do Clube da Escrita, ministrado pela
@anaholandaoficial.
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