Um ser chamado: Mulher!


 

O que você vê nessa obra de arte?

De bate e pronto eu responderia: Uma mulher de cabelos longos e sobrancelha junta.

Uma maneira bem “pobre” pra descrever Frida Kahlo, não é mesmo?

Pintora mexicana que baseou sua carreira criando retratos e auto-retratos – como o acima – inspirados na natureza. Sua referência foi a cultura popular do país, explorando questões de identidade, gênero e raça.

O seu trabalho ficou anônimo até o final de 1970, quando foi descoberta por historiadores de arte e ativistas políticos. Foi só no início dos anos 90 que ela ficou reconhecida na história da arte e, foi além, tornou-se um ícone para a sua nação. O seu trabalho é celebrado internacionalmente até os dias de hoje.

Eu confesso que assim que vi a imagem lembrei de Macabéa, jovem de 19 anos, personagem central do último romance de Clarice Lispector – A hora da Estrela.

Macabéa, alagoana, foi morar com uma tia, no Rio de Janeiro, quando ficara órfã.  Sua tia era muito religiosa, moralista e cheia de tabus, criando a sobrinha com tudo isso. Como se não bastasse toda essa carga que não era dela, Macabéa era constantemente castigada, ora com cascudos na cabeça sem motivos, ora proibida de degustar sua única paixão: goiabada com queijo.

A personagem era muito magra e pálida, cheirava mal, pois raramente tomava banho e não dormia direito em virtude de uma tosse persistente, causada pela azia – consequência do café frio que tomava antes de deitar, acompanhado por pedacinhos de papel, já que não tinha dinheiro pra comprar um pão.



Como falar de Macabéa sem falar da sua autora?

Clarice Lispector, por sua vez, nascera na Ucrânia - "Naquela terra eu literalmente nunca pisei: fui carregada no colo" - mas, declarava-se brasileira e pernambucana. Não tinha um estilo único, foi autora de romances, contos, crônicas, novelas e ensaios e, é até hoje, considerada uma das escritoras brasileiras mais importantes do século XX.

Sua obra está recheada de cenas corriqueiras de personagens comuns em momentos do cotidiano, ou seja, uma escrita a partir do inesperado, pois se tem algo inconstante é o nosso cotidiano. Destacando: Perto do Coração Selvagem, seu livro de estreia; Laços de Família, A Paixão segundo G.H, Um Sopro de Vida e A Hora da Estrela.


O que todas essas mulheres têm em comum?

C O R A G E M!

A primeira foi uma artista à frente do seu tempo. Posicionava-se, defendia causas e é um ícone dos movimentos feministas e LGBTQIA+, isso desde os idos dos anos 70, pelo que é visto como uma descrição intransigente da experiência e forma feminina.

Frida relacionava-se com homens e mulheres e, por causa das traições constantes, em especial o caso com Cristina, ela divorciou-se do seu grande amor Diego Rivera, período em que focou na carreira e aumentou a produção de quadros. Kahlo continuo quebrando tabus, quando trouxe para o mundo da arte algo que até então não era abordado pelos pintores - as questões femininas – abortos, partos e feminicídio.

A segunda ficou órfã muito cedo, criada sob ritos supersticiosos, tabus e maus tratos. Comeu o papel que o diabo amassou pra sobreviver na cidade grande. Eu disse papel, porque ela não tinha dinheiro pra comprar o pão.  Fedia, não se cuidava, mal sabia escrever, estudou pouco e, ainda assim, fez um curso de datilografia e arranjou um emprego. Tudo isso pra sobreviver depois que a tia morreu.

A última e não menos importante, nasceu em uma família judaica russa que, por causa da Guerra Civil Russa se viu obrigada a emigrar para fugir dos extermínios em massa. Clarice dizia não ter nenhuma ligação com a Ucrânia - "Naquela terra eu literalmente nunca pisei: fui carregada de colo" - sua verdadeira pátria era o Brasil, que recebeu ela e sua família em 1922.

Aqui, Clarice, mesmo tendo demonstrado interesse pelo mundo literário, ela estudou Direito na UFRJ mas, logo se consagrou como escritora, jornalista e contista, tornando-se uma das figuras mais influentes da Literatura Brasileira e do Modernismo.  

Mulheres à frente do seu tempo, buscando seu lugar no mundo, defendo o que acreditava, posicionando-se, impondo-se em tempos que o machismo, coronelismo e desigualdades por gênero eram muito mais evidentes do que hoje, elas já faziam a diferença e abriam portas para hoje, esse cenário está mais justo e democrático, embora ainda não seja o cenário ideal.

Para finalizar essa narrativa, gostaria de fechar com uma frase da Clarice que define bem tudo que foi falado:

“O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós.”

 

Gabi D.

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Texto produzido para o 1º desafio/FEV do Clube da Escrita, ministrado pela @anaholandaoficial.

O primeiro encontro de Fevereiro nos desafiou a escrever a partir de uma obra de arte, ou seja, a imagem da Frida Kahlo.

 

 

 

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