Qual a sua versão dos fatos?



Uma história que volta e meia vem à tona é a viagem de Paris. Essa viagem não teve só dois lados, foram quatro – número de passageiros da viagem.

A viagem era um sonho. Meu. Talvez aí estivesse o erro. Compartilhei com algumas amigas que, embarcaram na viagem. Planejei, como tudo que proponho a fazer. Pesquisei os lugares, roteiros, o que fazer, onde ficar, aonde ir. Tudo mesmo.

Errei em praticamente todas as hospedagens. Lyon tinha mofo de umas três gerações. Marselha era num barranco e, não cabia a gente as malas no quarto. A sorte foi um quarto desocupado, onde ficamos eu e as malas. Em Nice era tipo o interior do interior – pelo menos era espaçoso. Acho que só se salvou Paris, embora não tivesse elevador e era mala com força. Ufa!

A viagem já começou com stress. Até a véspera corria o risco de uma de nós não ir. Isso impactava no planejamento financeiro das demais e, pra piorar, não havia tempo hábil de nos readequar, ia ser bem complicado – no meu caso – fez perder o sono nas três noites que antecediam. A ida para o aeroporto também foi tensa. Aqui em Natal é longe – muito longe – era madrugada, pista sem iluminação e o uber quebrou. Não tinha sinal de celular.  Já comecei a ter uma crise de ansiedade.

Depois veio a questão de vibe/energia de duas que não se conheciam pessoalmente, logo o santo não bateu. E isso foi motivo para ter faíscas a viagem toda. Tudo de uma era motivo para irritar e gerar piada da outra e vice-versa.

Primeiro “passeio” / missão / compromisso da viagem começou com um show. Meu. Era um tititi aqui, um resmungado acolá, uma atrasando as demais e colocando a mesa posta pra tomar café da manhã, as demais fazendo caras e bocas. Eu que sou ou a ignorante mesmo, reapresentei todo mundo, coloquei os pingos nos is, disse o que todas queriam dizer e ficaram abafando. E disse, principalmente, que eu não era guia da viagem, nem supervisora e aquilo não era colônia de férias. Seguimos.

Mal sabia eu que a tão sonhada janela do céu me levaria ao inferno. Quanta irresponsabilidade da linha parte. Era uma trilha linda, acessível, sinalizada. Mas, não era pra mim. Gorda, fora de preparo ideal, com joelhos comprometidos, lombar e tornozelos sobrecarregados. Foi uma experiência muito difícil. Até hoje não sei como sobrevivi, quis Deus não me levar naquele dia.
Há dois dias de festar a vida. Há um dia de outra experiência tão ou mais horrível.

Ao chegar na bendita janela eu não estava feliz. Estava em crise, preocupada, calculando o tanto que faltava pra voltar e, sobretudo, tendo àquela máxima de que tudo que desce, sobe. Não tinha ânimo para posar pra fotos. Parecia que eu tinha travado naquela cachoeira e tudo que eu tinha força para fazer era o banho da gratidão. Até isso tentaram estragar. Eu tava calada, inerte e a treta delas sobrou até pra mim.

A volta, como eu temia, foi cruel. Entrei numa crise de choro. O que me travava ainda mais. Fiquei pra trás, o que por acaso me deixou em paz. Era silencioso. Eu estava só comigo e Diogo do Céu.

Tinha muita pedra, estrada, barro, lama e zero forças. Quis desistir. Pedi pra Deus me levar. Na subida Alícia parou pra me esperar, me deu força pra continuar. No choro, foi a vez de Heloísa me “levantar”. Na estrada sem fim, Isabel fez cia até a gente chegar.

Saí do parque sem olhar pra trás, jurei não mais pisar lá. Na cidade eu até penso em voltar, quero viver outra experiência, afinal tirei muitas boas lições lá.

O dia seguinte guardava mais surpresas. Passeamos pela cidadezinha de 700 habitantes. Almoçamos num lugar incrível. Fui fazer uma massagem terapêutica que foi um verdadeiro presente energético tamanha foi a sincronicidade com a terapeuta. Eu tava nas nuvens, saí e lá flutuando e, não dei 10 passos, quando encontrei com duas das meninas, o que eu não sabia é que o mundo havia desabado porque a outra tinha saído e, optamos por deixar a casa trancada, uma vez que essas duas estavam dormindo e só iriam sair quando aquela voltasse pra casa para pegá-las. Foi o suficiente pra eu ouvir tanto grito, desaforo, coisa infundadas, sem cabimento. Foram muitos. Mesmo.

Eu penso que a jovem em questão teve um surto e aproveitou para me dizer coisas de uma vida que estavam ali dentro guardadas, amargurando-a. É a única explicação. Aquilo tudo não era só por uma casa trancada. A outra pobi que saiu junto comigo e foi explorar a cidade, soube que ouviu um monte também. Digo “pobi” porque foi inocente, seguiu minha sugestão de roteiro e apenas acatou meu argumento de trancar a casa, ou seja, essa “culpa” era minha.

Eu ouvi tudo calada. Não discuti, tampouco, tentei me explicar. Eu só dizia pra ela se escutar. Pedi desculpas e segui pra casa. E fiquei na frente do verdão, contemplando o pôr do sol. A que estava com a inquisidora tentava me consolar, reforçando que eu não merecia ouvir nada daquilo, que foi sem necessidade, o problema dela não foi ter ficado trancada, mas ela precisava “descontar” em alguém. Eu só sabia dizer “tá tudo certo”, “só quero ficar sozinha”.

Como se não bastasse, ela voltou e continuou a praguejar. Eu juro que não estava ali, era só o meu corpo. Também não sei quem estava comigo, além de #DiogoDoCéu, mas eu podia sentir que era um exército muito maior. Eu me sentia blindada. Eu não absorvia nada que vinha dela. As lágrimas jorravam copiosamente, eu não conseguia controlar. É sempre assim, quando não consigo esbravejar.

Cessou. Acho que ela cansou. Foram as três jantar. Fiquei só. Como eu gostaria de estar. Arrumei a mala, afinal íamos embora de Lyon no dia seguinte. Graças a Deus. Tomei uns três remédios de dormir. Precisava apagar. Parece que consegui. Eu não queria pensar em tudo que acontecera. Nem queria lembrar que faltavam oito dias para a viagem acabar.

Vontade de ir embora? Tive muita.

Por que não o fiz? Porque não seria justo com as meninas que cortaram um dobrado para juntar a grana de levar. Todo o investimento. Fora que o custo para voltar era altíssimo, eu não tinha como arcar. Sem contar que os custos rateados eu pretendia honrar pra não prejudicar ninguém.

Para encerrar a saga vou contar como terminou a viagem, porque se para falar de dois dias eu escrevi duas páginas, avalie se eu contar a voagem toda?

Sabe como eu passei pelos outros dias? Bêbada. Eu bebia todo doa. Assim eu suportava continuar. Bebia pra dormir, acordava pra beber. A bebida me salvou ou pelo menos enganou bem. Viva o álcool.   

 

Gabi D. 

Texto 7 - Para a comunidade de Continuidade da Escrita Intuitiva do @gutanaka.

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