Não gostei dessa “mistura”!

 


O que as panelas de mainha estão fazendo no chiqueiro de dona Dione? Opps, no quintal.

1991 foi o ano que eu descobri o quanto eu era chata. Com limpeza, com organização, com comida. Ou melhor, foram as experiências daquele ano que fizeram eu desenvolver nojo de quase tudo que é comida.

Eu havia perdido mainha há cerca de seis meses. Voltei de Caicó com um vazio imenso no peito e, como se não bastasse, mudei de casa, de colégio, de rotina. Me rebelei. Eu era A revoltada. Nega trabalhava o dia todo e eu tinha que ir almoçar na casa da sogra dela pra poder ir pro colégio.

Na casa da sogra dela. Tá me dando embrulho só de lembrar.

(Respira, Gabriela)

Então, lá funcionava a oficina do marido dela na frente, passando por motor de carro, graxa (muita!), eu adentrava a casa. Não tinha como sentar no sofá, tinha roupa aos montes.

Fui pra cozinha esperar o almoço. Enquanto mexia a panela com uma mão e enxugava a testa com o pano de prato, ela disse: se assente que a mistura fica já pronta. Mistura é como chamavam a proteína. Inventei de perguntar o que era. Galeto.

Eu, furada desde sempre, pedi pra ir ao banheiro. Ela gritou dizendo: corra ali, fulano, pra ver se o bojo tá limpo. No quintal acidentado, tinha esgoto aberto, chiqueiro com galinhas, umas peças de carro sucateadas, o tanque cheio de baldes embaixo com roupas de molho. Até que cheguei ao banheiro. Fiz no chão. E foi sempre assim todas as vezes que eu precisei ir.

Eu vi as panelas de mainha porque na realidade eu queria era vê-la; queria comer o franguinho com graxa feito por ela e não graxa dos carros e tempero de suor; queria saber que o banheiro estaria limpo, mesmo com o monte de marmanjos que tinham lá em casa; queria que ela tivesse o poder de me tirar dali. Como doía sua ausência e tudo que veio de brinde por causa ela.

Comecei a chegar em cima da hora pra o marido de Nega me levar para a escola, assim eu escapava de almoçar. E descontava na coxinha (as vezes duas) com refrigerante do lanche. O que explica meu vício por Coca-Cola e meu tamanho redondo.

Já se passaram 30 anos e eu não consigo pronunciar o combo mistura-bojo-galeto. Eu tenho verdadeira aversão.

 

Gabi D. 

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Desafio 002Ago do Clube da Escrita, ministrado pela @anaholandaoficial.

O segundo desafio de agosto nos propõe escrever a partir de uma imagem selecionada. (a que ilustra o texto)

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